Como reverter a Violência no Campo de Rondônia?

O Chefe da Casa Civil entrega memorial ao Ouvidor Agrário Nacional. Foto cpt ro.
"Esta é a nossa história" disse Juscelino Moraes de Amaral na entrega do presente para o Desembargador Gercino Filho. Tratava-se dum livro sobre a Estrada de Ferro Madeira Mamoré. A. chamada Ferrovia do Diabo, estrada de ferro centenária que foi construída de 1907 à 1912,  comportou milhares de mortes de operários. " Se diz que cada trilho foi um morto na construção" acrescentou o Secretário Chefe da Casa Civil de Rondônia. O Ouvidor Agrário Nacional agradeceu a gentileza antes de se despedir para ir ao aeroporto de volta para Brasília.
Os conflitos e a violência pela terra em Rondônia foi o principal objetivo da 378a reunião de sexta feira pela manhã dia 03 de Agosto de 2012, realizada pela Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo. Realizada em Porto Velho, no gabinete do Secretário Chefe da Casa Civil do Governador de Rondônia, Juscelino Moraes do Amaral.
Momentos antes de iniciar, enquanto o Desembargador da Ouvidoria Nacional tinha defendido ante os meios de comunicação que a violência tinha diminuído, o representante regional da CPT em Porto Velho defendeu o contrário: No último ano, desde a morte de Adelino Ramos em maio de 2011 para cá, a violência contra os pequenos agricultores somente aumentou. De janeiro até maio de 2012 já somamos cinco mortes devidas a conflitos agrários em Rondônia. As ocupações e manifestações dos grupos que pressionam pela reforma agrária reduziram, sim. Nisso os datos da Ouvidoria e da CPT coincidimos. Porém a violência e os atos de pistolagem contra os pequenos agricultores aumentaram, e muito em Rondônia em 2011. A violência aumentou do lado dos fazendeiros, que em Rondônia dominam 3/4 partes da terra de agricultura.


No dia depois da reunião do Gabinete da Casa Civil de Porto Velho, sábado dia 05 de agosto de 2012, faltou pouco para acrescentar mais uma morte nesta lista fatídica: Soeli, companheira do Paraíba, uma das principais lideranças do Acampamento Paulo Freire 3 foi atingida violentamente por um golpe de foice que fez temer pela vida dela. Internada num hospital que não é divulgado, por medo de que os agressores queiram continuar a terminar com a vida dela, hoje segundas feira, 06 de agosto de 2012, parece que escapou do perigo de perder a vida. O companheiro e família dela tentam se esforçar para conseguir os exagerados recursos que os médicos exigem para fazer a cirurgia da qual ela precisa. Nenhum dos quatro agressores que a rodearam para este ato de violência está detido. Para entrar no acampamento dos pequenos agricultores, tomado por bandidos que agem violentamente, precisa furar o bloqueio na entrada que eles mantém. Eles tentam evitar a todo custo o despejo anunciado pelos próximos dias de agosto.
Para a reunião de sexta feira tinham sido convocados os membros da Comissão do Estado ara Conflitos Agrários estado de Rondônia e foi convocada a pedido do Ouvidor Agrário Nacional,  Desembargador Gercino Filho. Também teve representantes da segurança do Estado, o delegado do MAD Genair Capelini, representantes do INCRA, IBAMA e do MPF, entre outros. Convocados de última hora os movimentos sociais, apenas representantes da CUT e de CPT Rondônia estiveram presentes na reunião, que tinha com o principal objetivo debater os conflitos e a violência no campo em Rondônia.
Atuação do Governo do Estado. Ednéia Guzmão, responsável de regularização fundiária da Secretaria de Agricultura, pelo  Governo do Estado apresentou o resultado da reunião acontecida em Brasília no dia anterior, 02/08/12 em Brasília entre Confúcio Moura, governador de Rondônia e o novo presidente do INCRA, Carlos Mario Guedes de Guedes.
Nela se apresentou o avanço conseguido na emissão de títulos pelo Terra Legal a partir da atuação conjunta do MDA e o Governo Estado e aplicação de nova metodologia. O Terra Legal vai concentrara a sua atuação na área de fronteira e o governo do estado vai pedir a participação dos cartórios de registro de imóveis para que os títulos sejam registrados logo após a emissão dos mesmos.
Atuação nas áreas de conflitos. Foram selecionadas cerca de 70 imóveis para atuação prioritária. Equipe de advogados da união (CONJUR/MDA)  vai realizar logo em Porto Velho  análise dos processos, muitos deles áreas com títulos provisórios inadimplentes (CATP).
No Acampamento Canaá, o INCRA já está realizando nova vistoria, contemplando a negociação da área. O Governo também se compromete a fazer gestões junto a justiça estadual, e avançar nos lugares onde não existe conflito. Iniciará a titulação dos Projetos de Assentamento Pelo PA Machadinho e PIC Ouro Preto. Neles foi realizado um convênio para a realização dos serviços de topografia. Um programa de atuações deve ser definido em breve.
Indicação de dois magistrados para conflitos agrários. Dois magistrados, um em Ji Paraná, e outro em Porto Velho, foram indicados para "dirimir os conflitos fundiários no biênio 2012/2013. A indicação partiu do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia - Departamento do Conselho de Magistratura.
Presentes alguns dos principais responsáveis da polícia civil e militar de Rondônia a dificuldade em registrar e dar andamento aos boletins de ocorrência registrados por trabalhadores rurais foi um dos primeiros assuntos da pauta tratados na reunião. Esta queixa, recolhida em 15/03/12 em Vilhena pelo Ouvidor Nacional Agrário constava no primeiro ponto da pauta da reunião. O responsável pelos inquéritos da Polícia Civil, Dr. Eneas, se comprometeu a que este problema não vai mais continuar. Também não vai se repetir atitudes como a dum delegado de Vilhena, que recusou legitimidade ao Ouvidor Agrário nacional e se negou a dar informações sobre um agricultor desaparecido.
Dois delegados da polícia civil foram indicados para atender esta demanda específica de atendimento de conflitos agrários. 
O representante da CUT anunciou que está apresentando reclamações até a nível internacional pela prisão do Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Vilhena, o qual tem provocado grande descontentamento na área rural.
Segundo o Desembargador Gercino, faz treze anos que luta para mudar a atuação da vara agrária de Rondônia. Disse não achar bom a maneira como ela funciona. Somente os conflitos que são reconhecidos como agrários vão parar nesta vara agrária. Muitos juízes decidem sem receber as duas partes em conflito e encaminhar diretamente para a vara agrária os conflitos existentes. Aí acaba que muitos conflitos são resolvidos aplicando o direito civil nas causa agrárias, quando o que precisa é aplicar o direito agrário nas causas civis. Assim por exemplo, para aplicar uma liminar de reintegração de posse ele deve comprovar que se o imóvel é produtivo, se não foi grilado de terras públicas, se houve destruição ambiental
Por parte da CPT RO, reiterando petições da última reunião, apresentamos ofício à Secretaria da Casa Civil pedindo esclarecimentos do andamento dos inquéritos sobre as cinco mortes acontecidas neste ano 2012 no estado de Rondônia por motivo agrário ou ambiental: Gilberto Tiago Brandão, Ercias Martins de Paula, Dinhana Nink, Renato Nathan Gonçalves Pereira e José Barbosa da Silva. Também proteção para cinco agricultores/as gravemente ameaçados de morte, accionando convênio do Estado de Rondônia com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, para o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos. A companheira dum dos ameaçados citado é quem foi violentamente ferida o passado sábado.
A situação do Sul do Amazonas que envolve jurisdição do estado vizinho também é motivo de preocupação, pois algumas das situações de violência acontecem no vizinho estado em acampamentos situados nas proximidades de Rondônia, com agressores vindos daqui e sem presença efetiva das autoridades amazônicas. A CPT RO reiterou a necessidade de uma reunião conjunta para reativar o acordo de cooperação dos dois estados e o tornar mais efetivo para coibir a violência nestas áreas, que envolvem a região da Ponta de Abuná-Sul de Lábrea, e a BR Porto Velho - Humaitá, dentro do município de Canutama.
Neste sentido o testemunho de Maurício Arza Guadalasua, liderança do Acampamento Rio Azul, foi muito convincente. Ele mostrou um cartucho deflagrado ê que foi disparado contra a pernas de um dos acampados e destruiu o seu motoserra a tiros. Logo depois da reunião o cartucho foi sometido a prova de marcas dactilares, e existe a suspeita de policiais de Rondônia continuem agindo de forma irregular no local. Como provável represália desta denúncia, na madrugada de hoje, 06 de agosto de 2012, foi ateado fogo no carro estacionado na casa dele no referido acampamento. Os acampados conseguiram que o fogo não expandisse na cada dele, porém o lugar e corro resultaram completamente danificados. 
Também a Defensoria Pública do Estado de Rondônia, representada na reunião, se comprometeu a indicar com esta finalidade dois defensores públicos do estado.
Para terminar a reunião acho que não foi feliz a lembrança das milhares de mortes acontecidas em nosso passado, na construção da estrada de ferro, vítimas do capitalismos selvagem e da exploração da borracha, a inícios do século passado. Apesar disso, a  Estrada de Ferro significou o nascimento das cidades de Porto Velho e de Guajará Mirim. A Rondônia da colonização e dos garimpos do Madeira já foi também a história da impunidade e da violência. Porém hoje em dia não podemos permitir que o nosso estado continue crescendo tendo como vítimas os operários das usinas e os pequenos agricultores que precisam de terra para sobreviver. Esta não pode continuar a ser a nossa história.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NOTA PÚBLICA - HOMENAGEM RIDICULARIZA RONDÔNIA E ESTIMULA A CRUELDADE CONTRA AS MINORIAS.

Santo Antônio do Matupi, no Km 180 da transamazônica.

O acidente das usinas que nos esconderam