Mídia de Rondônia ignorou nota dos bispos sobre as enchentes


Campanha de solidariedade na Paróquia São João Bosco de Porto Velho. foto paróquia
Josep Iborra Plans*

A mídia de Rondônia ignorou a Nota dos Bispos sobre as enchentes do Madeira.
Sabemos que desde o começo da construção, as empresas das Usinas de Santo Antônio e de Jirau tem feito grandes esforços para coaptar as informações e a mídia local. Desta vez não tem sido diferente tentando informar apenas das enchentes, porém sem qualquer referência à responsabilidade das mesmas diante do desastre ambiental e social atual. 

A coaptação da informação local sobre a situação atual e a responsabilidade das usinas parece que volta a toa como mostra o silêncio quase unânime da mídia de Rondônia diante do posicionamento dos bispos católicos de Rondônia, Acre e Sul de Amazonas, a maioria de dioceses diretamente atingidas pelas enchentes do Madeira.

Pelo que tem podido ver, após uma semana da publicação, praticamente toda a mídia de Rondônia têm ignorado a Nota dos Bispos Católicos da CNBB Noroeste sobre as enchentes do Rio Madeira e seus afluentes, que atingem gravemente o povo das Dioceses Católicas de Guajará Mirim, Rio Branco, Porto Velho, Humaitá. 

Notícias sobre solidariedade da Igreja Católica aos desabrigados são publicadas.

Tem encontrado mais eco na mídia a campanha de Solidariedade da Arquidiocese de Porto Velho (iniciada em 13 de fevereiro de 2014) e da Diocese de Guajará Mirim (iniciada em 11 de março de 2014), que desde o primeiro momento tem aberto as paróquias para acolher os desabrigados e estão recolhendo e distribuindo donativos, cestas básica e todo tipo de ajudas as famílias que tiveram que abandonar seus lares pela cheia histórica do Rio Madeira.

Paróquias como a de São João Bosco, que realiza acompanhamento pastoral das comunidades do Alto Madeira, continuam acolhendo famílias e mobilizando voluntários para distribuir as famílias desabrigadas, que receberam inclusive visita do governador do estado no local. No local da paróquia funciona um dos oito centros de recolhida de alimentos e de ajuda para os desabrigados da Arquidiocese e no mesmo local estão acolhidas quinze famílias atingidas do bairro Triângulo e Candelária.

Questionamentos dos bispos as Usinas do PAC não devem ter sido bem recebidos. 
Caridade e solidariedade nas igrejas é bem recebida. Religiosos falar de políticas públicas, nem tanto. Algumas das mesmas páginas da mídia que ignoraram completamente o posicionamento conjunto dos bispos da CNBB Noroeste, publicaram porém informe publicitário pago pelas usinas para se apresentar como "inocentes cordeirinhos" vítimas da natureza feroz do Rio Madeira, coincidindo com o discurso da Presidenta em sua vinda a Rondônia.

Na Nota da CNBB Noroeste de 29 de Março de 2014 os bispos de Rondônia, Acre e Sul de Amazonas consideraM as causas naturais das alagações, sem esquecer das responsabilidades humanas: 
  • "Sabemos que catástrofes naturais ameaçam a vida no nosso planeta desde o princípio. A terra é um planeta vivo que se reconfigura continuamente. No entanto, acreditamos que há novos fatores como o aquecimento global que acelera o descongelamento das geleiras das montanhas, desmatamentos e processos erosivos no solo, a formação de represas para geração de energia elétrica".
Por isso a nota questiona a responsabilidade da construção das Usinas de Santo Antônio e Jirau: 
  • "As águas abundantes que descem das montanhas da Bolívia e do Peru aumentaram consideravelmente os reservatórios das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio. A construção dessas duas obras no Alto Rio Madeira, além de sofrer um atraso de mais de um ano, segundo especialistas, apresenta erros no estudo de impacto ambiental".
Apelando aos grandes problemas já provocados, apoiam a necessidade de realização de novos estudos ambientais por causa dos problemas causados com a alagação das estradas e isolamento do estado de Acre e região de Gujará Mirim:
  • "A inundação das BRs 364 e 425 isolou o Estado do Acre, a região de Guajará-Mirim e toda a área do Abunã. O difícil abastecimento de suas populações, com combustíveis e alimentos, mostra a urgência de novos estudos".
Questionam o Governo pela falta de cuidado ambiental e de interesse por outras fontes de energia: 
  • "Sem desconsiderar o esforço do governo para oferecer à população do País energia elétrica de qualidade, lamentamos a falta de cuidado com os estudos de impacto ambiental que, por sinal, não contemplaram o Médio e o Baixo Madeira. A falta de interesse em fontes alternativas de energia, tais como a solar, eólica e de bio-massa, abundantes no Brasil, nos faz questionar: Por que?"
Manifestam apoio as ações judiciais promovidas pelo Ministério Público, Ministério Público Federal, Ordem dos Advogados do Brasil e Defensoria Pública, acatadas em primeira instância pela Justiça Federal: 
  • "Manifestamos apoio à ação civil pública que tramita perante a Justiça Federal de Porto Velho relativamente ao seu propósito de atender as necessidades básicas (moradia, alimentação, transporte, educação e saúde) da população atingida pela enchente do Rio Madeira".
Falando das "catástrofes" que atingem as populações da bacia do Madeira e do Acre, solicitam das autoridades uma nova investigação técnica dos impactos ambientais e sociais das usinas: 
  • "Solicitamos com insistência às autoridades competentes uma nova e criteriosa investigação técnica das construções e dos impactos ambientais e sociais. Que ela seja feita por profissionais especialistas e independentes. Precisamos fazer o possível para evitar ou minorar as consequências das catástrofes que põem em perigo a vida e os bens das populações da cidade de Porto Velho, do Vale do Rio Madeira, do Acre e regiões adjacentes".
Urgem a solidariedade de todos e das autoridades chegam a pedir um "salário emergencial" para as "famílias flageladas": 
  • "Nesse momento, urgimos junto aos poderes públicos que deem a devida assistência às famílias flageladas da área urbana e rural para que possam recuperar suas casas, visto que o direito à moradia é um direito constitucional. Compete ainda ao Governo adotar medidas que facilitem o acesso a créditos com tempo de carência e juros baixos, bem como fornecer orientação técnica a fim de que as famílias possam reorganizar os seus meios de sobrevivência. Acrescenta-se ainda a necessidade de socorrer as pessoas e famílias flageladas com um ‘salário emergencial".
Que eu saiba, nenhum político ou autoridade de Rondônia têm se manifestado a favor ou em contra da Nota da CNBB Noroeste. Se o posicionamento dos bispos incomoda a política dominante da República, o silêncio da mídia somente desmoraliza ela mesma e fala de sua parcialidade neste assunto.No meu parecer, diz sobre falta de rigor, isenção e ética profissional. 
02 de abril de 2014

Josep Iborra Plans. é membro da Equipe de Articulação da Amazônia da CPT e da Comissão Pastoral da Terra de Rondônia. 


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